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25/06/2012 – Atualizado em 31/10/2022 – 8:48am

Numa histórica fazenda da época dos barões do café, pesquisadores aprimoram uma tecnologia que pode parecer ficção científica, mas é apontada como uma das chaves para o desenvolvimento da bacia leiteira do Rio. Vacas como "barrigas de aluguel" e "bezerras de proveta" fazem parte de uma das ações de melhoria genética em curso no estado e cada vez mais populares entre os pequenos produtores.

Isso acontece no momento em que o estado recebe mais uma grande empresa de beneficiamento de leite. No começo do mês, a Brasil Foods, que controla marcas como Batavo e Elege, iniciou as obras de sua nova unidade em Barra do Piraí, às margens da BR-393. Graças à presença de outros gigantes do setor, como Nestlé e LRB (Bom Gosto e Parmalat), a estrada já foi apelidada de "Via Láctea".

Por ano, consomem-se no Rio 3,2 bilhões de litros de leite, bem mais do que as 1,2 milhão de vacas fluminense produzem atualmente, cerca de 610 milhões de litros anuais. Com mais vacas de alta qualidade genética, trazidas de fora do estado ou nascidas aqui por inseminação artificial ou fertilização in vitro, a Secretaria estadual de Agricultura e Pecuária (Seapec) espera um crescimento para um bilhão de litros anuais até 2016. Proporcionalmente, a produção do rebanho de Gilder Fernandes Pinto, de Itaocara, cresceu mais quando o criador adquiriu 20 vacas de alta qualidade genética, há dois anos.

— O rebanho dobrou, mas a produção triplicou. Hoje, tiro 270 litros mensais e espero chegar aos 400 nos próximos anos, quando as bezerras que nasceram dessas vacas top de linha começarem a dar leite — comemora o produtor.

Gilder é um dos 700 pequenos criadores beneficiados pelo programa Rio Genética, da Seapec, criado em 2009 com a intenção de melhorar a qualidade do gado no estado. Primeiro, ao trazer animais de boa linhagem de estados vizinhos, e revendê-los a pequenos produtores em feiras e leilões, com linhas de crédito especiais e facilidades de pagamento. Até o momento, mais de seis mil cabeças de gado foram distribuídas nesse sistema.

A segunda etapa começou há um ano, com a inseminação artificial de tempo fixo (Iatf), quando o cio é induzido por medicamentos para garantir a prenhez. Produtores que já haviam comprado os animais do programa recebem de graça sêmen de touros selecionados e o tratamento veterinário.

A próxima tecnologia a ser disponibilizada aos pequenos pecuaristas fluminenses é a fertilização in vitro, já bastante usada por grandes produtores de todo o país. A parceria entre Embrapa e Pesagro-RJ, órgão de pesquisa agropecuária ligada à Seapec, já viu nascer suas primeiras bezerras de proveta — só fêmeas são geradas no programa — na Fazenda Santa Mônica, em Valença. Todo o processo, envolvendo apenas animais de boa genética, acontece lá: óvulos são retirados de vacas da fazenda e, no laboratório, recebem espermatozóides de touros premiados trazidos de fora.

O embrião demora oito ou nove dias para se formar, antes de ser inovulado em "barrigas de aluguel". A futura bezerrinha será sempre uma Girolando, raça escolhida desde o começo do programa por ser a que melhor se adapta às características do Rio. As primeiras do projeto já nasceram, há cerca de cinco meses. A secretaria, porém, ainda não definiu como os animais serão repassados aos produtores beneficiados pelo projeto.

— É uma mistura das raças gir e holandesa. A primeira, de origem indiana, garante rusticida-de, boa resistência aos parasitas e adaptação ao clima. Já a segunda tem ótima produção leiteira, mas é pouco adaptável aos trópicos. O produto das duas raças é um animal perfeito para o clima da maior parte do Brasil. Um girolando de alta qualidade genética pode dar quatro vezes mais leite que uma vaca holandesa mal adaptada às condições locais, por exemplo — explica o coordenador do Rio Genética, Luiz Altamiro Nogueira.

Segundo Nogueira, ainda não há um modelo definido para a disponibilização desses animais aos pequenos criadores do estado. Mas ele acredita que a melhoria considerável da raça, a mais popular entre os produtores de leite da região, será fundamental para consolidar a crescente indústria leiteira do estado. Opinião compartilhada pelo presidente da Associação Brasileira de Criadores de Girolando, José Donato Dias Filho.

— A genética sempre foi a saída para aumentar a produção de leite no Rio, já que temos uma área tão pequena. Vejo um futuro promissor, porque a tecnologia, antes restrita aos grandes produtores, está se popularizando. E deve aumentar com a presença das grandes empresas, que certamente vai forçar melhores resultados por partes dos produtores — acredita Donato, que também é proprietário de uma fazenda em Miguel Pereira.