Médicos veterinários e estudantes criam banco com material genético de animais silvestres atropelados

26/01/2017 – Atualizado em 31/10/2022 – 8:46am

Por Roberta Machado

Com o objetivo de preservar a fauna silvestre, a Faculdade de Medicina Veterinária da Universidade Federal de Uberlândia (UFU) e o Hospital Veterinário da instituição estão estudando a possibilidade de aproveitamento do material genético dos animais atropelados na região.  A partir do sêmen colhido dos animais que morrem nas estradas, o grupo espera construir um banco genético que pode ser usado na reprodução assistida das espécies ameaçadas.

O médico veterinário e professor André Quagliatto conta que, além de auxiliar na reabilitação dos animais feridos nas estradas da região, o hospital veterinário da UFU também recebia carcaças de espécimes atropelados, que serviam como instrumento de aprendizado dos estudantes de Medicina Veterinária. “Aproveitamos esses animais para ensinar aos alunos sobre anatomia, aspectos ligados à dieta, enfim, sobre o modo de vida desses animais”, conta Guagliatto, coordenador técnico do Laboratório de Pesquisa em Animais Silvestres (Lapas).

A partir da análise dos restos das espécies selvagens, foi considerada a hipótese do aproveitamento do sêmen preservado nas carcaças, um método que já é aplicado em animais domésticos. “Mesmo após a morte do animal, os espermatozoides se mantêm vivos por algumas horas. Usando esse conhecimento prévio, começamos a investigar o aparelho reprodutor desses machos”, descreve Quagliatto.

Desde o ano passado o grupo trabalha no desenvolvimento de técnicas para coletar o material das diferentes espécies que chegam à instituição. “Nós fizemos algumas adaptações do que fazíamos com animais domésticos, porque os animais silvestres têm o trato reprodutivo muito pequeno. Conseguimos resultados bastante interessantes”, explica Teresinha Assumpção, professora de Medicina Veterinária da UFU. “Estamos numa fase bastante inicial, ainda é um desafio grande conhecer em detalhes as técnicas para cada espécie”, ressalta.

O procedimento pode durar cerca de duas horas e exige o trabalho de uma equipe de oito pessoas, entre residentes e alunos de Medicina Veterinária. Quanto mais rápida é a retirada, maior a chance de o sêmen ser aproveitado. “Trabalhamos em uma onça parda e, umas 10 horas após a morte dela, ainda tínhamos entre 15% e 20% de células viáveis”, conta Teresinha. Algumas espécies podem preservar o material genético por até 48 horas após a morte do animal.

O material é congelado em recipientes especiais, resfriados com nitrogênio líquido a 196 graus negativos. A técnica pode ser usada para a coleta de sêmen, de folículos das fêmeas ou de embriões. Se bem conservadas, as células podem ser usadas em um prazo indeterminado.

 

Recuperação

De acordo com o Centro Brasileiro de Estudos em Ecologia de Estradas (CBEE), no Brasil, cerca de 475 milhões de animais silvestres morrem por ano nas rodovias, vítimas de atropelamentos. Somente no trecho da rodovia BR-050 que liga Uberaba a Uberlândia, são atropelados quase 700 animais por ano.

“Lamentamos o número de animais atropelados, e fazemos um esforço para que continuem vivos. Mas a maioria sucumbe na própria rodovia, então estamos tentando criar uma alternativa. A partir da morte daqueles animais, procuramos recuperar alguma coisa daquele patrimônio genético”, ressalta André Quagliatto. Os animais atropelados são encaminhados para o laboratório pela Polícia Militar Ambiental.

A instituição já conta com um pequeno banco de espermatozoides recolhidos de três espécies: uma onça parda, um veado catingueiro e um lobo-guará. Mas o grupo também espera armazenar ovócitos, e em breve vai coletar o material de fêmeas. A equipe ainda não adianta quando será realizada a primeira inseminação com o material genético, mas espera que os procedimentos possam ser feitos com animais em áreas de proteção ambiental ou em zoológicos.

 

Assessoria de Comunicação do CFMV, com informações do UFU plural