Instinto

28/01/2013 – Atualizado em 31/10/2022 – 9:05am

Dos 53 animais do Batalhão de Policiamento com Cães, 28 passaram por dois meses de treinamento e já trabalham nas ruas. A especialidade deles é identificar drogas, armas e explosivos. Em troca, ganham carinho e reconhecimento da corporação
Em troca de um brinquedo de estimação, eles localizam drogas, explosivos e fazem cara de poucos amigos para proteger seus adestradores. São treinados para atacar quando for necessário, mas, por trás das raças agressivas, os cachorros do Batalhão de Policiamento com Cães (BPCães) são dóceis e se tornam atração por onde passam. Hoje, 53 cães vivem no canil da corporação. Vinte e oito estão preparados para irem às ruas. Os outros ainda passam por treinamento rigoroso e é preciso ter vontade de trabalhar para conseguir se tornar um integrante da equipe.

Eles chegam à Polícia Militar por meio de licitações. A última levou seis novos animais ao quartel. Participaram da seleção dobermanns, pastores-alemães, rottweilers, labradores e staffordshire bull terriers. Só passaram pelas fases de teste os que demonstraram instinto aguçado e vontade de trabalhar. Os preguiçosos não têm vez. "Testamos cachorros, a partir de oito meses, do Brasil inteiro. Os escolhidos são os que têm boa socialização e mais agitação", conta um dos adestradores, o capitão Renato Cezário Guimarães.

Os que nascem no Batalhão começam a ser estimulados no primeiro dia de vida. São submetidos a alturas e temperaturas variadas. Para começar a testar o faro, os filhotes são colocados distantes da mãe. A fome faz com que, pelo cheiro, eles voltem para se alimentar. Treinam debaixo de sol ou de chuva, mas, para cada dia de trabalho, ganham um de folga. "Eles ficam prontos para atuar em qualquer situação, afinal, o trabalho da polícia é feito em todas as ocasiões. E quando eles estão preparados, não há barulho ou temperatura que os incomodem ou tirem a atenção deles", conta o comandante do BPCães, major Petercley Franco.

Proteção
A especialidade dos cachorros do BPCães é a localização de explosivos, de entorpecentes e de armas e munições. Para que os animais não fiquem dependentes das substâncias, o treinamento é feito com brinquedos que os próprios cães escolhem. "A gente coloca uma caixa e eles decidem o que querem. Com esse objeto fazemos todos os treinamentos", afirma o capitão Renato Cezário. Alguns se apegam a ossos, a bolinhas, e outros, a pneus de carros. "Nesses casos, fica um pouco difícil carregar o pneu de um lado para o outro, mas precisamos fazer, né?", brinca o capitão.

Com o brinquedo escolhido, o trabalho fica mais fácil. Porções de drogas, como cocaína, maconha, merla e crack, são colocadas sempre juntas ao objeto do animal. O faro deles fica acostumado ao cheiro da substância, mas os policiais garantem que isso não afeta a saúde dos animais. "O que eles querem é o brinquedo, e não a droga. Pelo faro, eles encontram os entorpecentes, mas logo esquecem aquilo quando ganham o objeto deles. Nós trabalhamos com os cães respeitando todos os direitos dos animais", garante o major Petercley Franco.

Após dois meses de treinamento, eles estão prontos para irem às ruas ao lado dos policiais. Os rottweilers geralmente ficam apenas posicionados para a proteção dos militares. As outras raças usam o faro para detectar qualquer movimentação ou objeto diferente. E quando eles demonstram desconfiança é certo que os militares encontrarão o que procuram. "O faro deles é de 100 a 150 vezes mais apurado. Dificilmente erram. Não há tempo ruim com eles", reconhece o comandante do BPCães.

Mascotes
Como os cachorros são acostumados a atuar em situações de risco, eles não podem ser mimados o tempo inteiro. Os carinhos podem ser mais fervorosos quando cumprem o trabalho, ou seja, quando localizam produtos escondidos por criminosos. Mas é raro não fazer afagos nas mascotes do grupo. É o que conta a policial Suelen França Fialho. Ao lado do pastor-alemão Chacal, a militar conta que é impossível não se apegar aos animais. "Eles conquistam a gente, ajudam o nosso trabalho e também nos dão carinho", diz. Chacal participa de algumas operações e é a mascote do Colégio Militar de Brasília.

Outra mimada no batalhão é Dona. Aos 7 anos, a labra-lata, como é chamada carinhosamente por ser uma mistura de labradora com vira-lata, é especialista na localização de drogas e armas. Em demonstração ao Correio, a cadela encontrou duas vezes porções de drogas escondidas dentro de uma mala. Quando sentiu o cheiro da substância, Dona tentou abrir o objeto com as patas incansavelmente. Só deixou a substância de lado quando ganhou o seu brinquedinho: uma bolinha de plástico azul.
Perder um dos animais é tristeza coletiva no quartel. No ano passado, durante uma operação para ajudar a Polícia Federal a encontrar um preso, a pastor-alemão fêmea Íris caiu de cima do prédio da PF. "Eles (os cães) se tornam tão autoconfiantes nesse trabalho que não têm medo de nada. Íris seguiu o faro dela e pulou do prédio na tentativa de ajudar", lamenta Petercley Franco.

O BPCães conta, hoje, com 104 policiais que ajudam a cuidar dos animais. Dois veterinários e 75 adestradores fazem parte do grupo. E, para manter a família canina bem alimentada, os militares dão cerca de 800 gramas de ração, por dia, para cada cachorro. "Eles são as nossas estrelas. O policial que trabalha com esses cães desenvolve paciência, tranquilidade e persistência. Eles são as melhores ferramentas não letais de combate ao crime", conclui o major.