Finanças

17/02/2011 – Atualizado em 31/10/2022 – 9:20am

Investidores brasileiros e estrangeiros divergem quanto aos motivos que os leva a investir no Brasil: Enquanto os brasileiros confiam em sua terra natal e investem porque ela apresenta um quadro econômico estável, estrangeiros parecem optar por investir no Brasil devido ao crescimento que o País tem apresentado nos últimos anos. Essa é uma das conclusões de Anna Lygia Costa Rego, autora da tese de doutorado apresentada à Faculdade de Direito (FD) da USP, Aspectos jurídicos da confiança do investidor estrangeiro no Brasil. A advogada também concluiu que os brasileiros parecem confiar menos no Brasil para investimentos.“Enquanto 80% dos investidores de outros países são otimistas para investir aqui, apenas 30% dos brasileiros têm o mesmo ponto de vista”, explica a pesquisadora.

Um dos objetivos da pesquisa é identificar as diferenças de percepção quanto ao Brasil entre residentes e não residentes e verificar em que medida variáveis jurídicas são apontadas como um razão para se confiar ou não no País. Para desenvolver seu trabalho, a autora utilizou-se de arcabouço teórico que inclui o programa Heuristics and Biases, ganhador do prêmio Nobel de 2006 que analisa justamente as falhas no processo decisório dos agentes. Com base neste programa de pesquisa levantou a questão de que algumas crises de confiança poderiam estar motivadas por equívocos no julgamento dos agentes, especialmente no contexto no sistema financeiro.

Para encontrar tais resultados, Anna Lygia desenvolveu uma pesquisa empírica, em três diferentes modalidades: entrevistas qualitativas com representantes-chave de órgãos reguladores brasileiros dos mercados financeiros e de capitais; uma pesquisa qualitativa com investidores brasileiros e estrangeiros por meio de questionários; e um experimento, baseado em discussão de grupos focais com estudantes universitários. A advogada teve diferentes enfoques em cada uma das etapas, sempre buscando, porém, a tradução do que se denomina correntemente como “confiança”. Além disso buscou investigar os determinantes, dentre eles os aspectos jurídicos, da confiança no País.

Conceito intuitivo
Ao conversar com os representantes dos órgãos reguladores, a pesquisadora percebeu que, para alguns, a confiança não é necessariamente um aspecto técnico. Houve certa dificuldade de se levantar exemplos concretos de uma regulação que trate de confiança especificamente. “O que percebi em minha pesquisa é que a falta de definição concreta para a palavra ‘confiança’ faz com que os processos decisórios na mente das pessoas seja comprometido”, explica a advogada.

Questionando investidores, ela percebeu que os estrangeiros apresentavam respostas muito semelhantes entre eles, e que sua preferência por investir no Brasil se devia principalmente ao crescimento do País. Os brasileiros, porém, deixam claro que a estabilidade econômica em relação a décadas anteriores é fator determinante para se investir.

Em sua discussão com estudantes, a autora quis saber qual era o efeito de um contexto negativo sobre o julgamento dos agentes. Aplicou assim um questionário a diferentes grupos de estudantes de Direito sobre a situação da economia brasileira de forma que as perguntas fossem respondidas livremente. Depois, apresentou a outros estudantes, também de Direito, uma notícia sobre os problemas enfrentados pelo Brasil em Honduras, quando o presidente deposto da época, Manuel Zelaya, se refugiou na embaixada brasileira. A advogada notou que, sem contexto algum, a visão dos universitários era mais otimista em relação ao País. “O grupo de estudantes que não discutiu notícias negativas sobre política externa envolvendo a América Latina apresentou respostas espontaneamente mais confiantes no Brasil do que aquele que preencheu o questionário logo após a discussão sobre a situação hondurenha”, explica a advogada.

Definição distorcida
A pesquisadora afirma que o Direito pode ajudar no processo decisório, evitando a decisão precipitada de realizar investimentos, fazendo com que estereótipos mentais sejam eliminados. “A confiança, hoje, é um conceito muito baseado na intuição e em regras decisórias muito simples, praticamente ‘atalhos mentais’, especialmente porque as decisões se dão sob ambientes cada vez mais complexos onde há pouco tempo para decidir. Há quem não queira investir no Brasil, por exemplo, porque pensa apenas que somos um país latinoamericano, e que a proximidade, geográfica, histórica ou cultural nos assemelha a nossos vizinhos. Em tempos de crise, o Brasil foi associado de forma negativa a Venezuela, Argentina e outros países, por exemplo”, aponta a pesquisadora. Hoje há indícios para crer que o Brasil tenha conseguido “se descolar” de certa forma deste tipo de estereótipo. Contudo, quando é investigado mais a fundo o que motiva a confiança nos agentes, percebe-se que as variáveis ainda são muito intuitivas e o julgamento ainda sujeito a critérios superficiais e pouco analíticos.