ESPECIAL – O zootecnista faz a diferença na Sustentabilidade
28/05/2019 – Atualizado em 31/10/2022 – 8:33am
Menino de cidade grande, aos 10 anos Carlos Saviani começou a frequentar uma fazenda no interior de São Paulo e se apaixonou pelo estilo de vida e a produção animal. Filho de um administrador e consultor de empresas, a escolha pela faculdade de Zootecnia parecia natural para reunir os dois interesses. E assim aconteceu. “Entrei no curso com a cabeça aberta, minha intenção era aprender sobre produção animal”, conta, lembrando que estagiou em fazendas de gado de leite, corte, piscicultura, suinocultura e produção de mel, tudo para conhecer o máximo sobre a profissão.
Ao se formar, foi logo gerenciar a produção animal e uma equipe de sete funcionários na modernização da produção de uma fazenda em Itapeva (SP), sob a coordenação de um engenheiro agrônomo. Foi quando começou a ganhar tarimba na área de negócios e fez um curso de administração rural. “Ali despertou meu interesse pela área de Marketing, pois ela conecta o ambiente da empresa ao mundo exterior, fornecendo ferramentas para entender as demandas e exigências do mercado e traduzi-las na produção de soluções ao cliente na forma de produtos e serviços”, define.
Esse interesse o levou, pela primeira vez, a estudar nos Estados Unidos. Com dois anos e meio de formado, foi cursar Gestão de Marketing, ao mesmo tempo que escrevia para uma revista e, num misto de “furo de reportagem” com sorte, foi convidado a trabalhar numa multinacional da área de genética que estava se instalando no Brasil após a aquisição da líder de mercado local. Pela primeira vez, ia atuar como profissional de marketing. “Com certeza errei e aprendi muito, pois foi um desafio fazer a transição na imagem, no relacionamento com os clientes. O marketing no agronegócio ainda engatinhava na década de 1990”, recorda-se Saviani, que depois seguiu carreira em outras multinacionais e foi levado para fora do país. Ao elaborar estratégias globais de marketing, teve a oportunidade de viajar pelo mundo e conhecer a realidade da produção animal nos quatro cantos do planeta.
O estalo da sustentabilidade
Mesmo sem saber, muitas soluções que Saviani ajudou a desenvolver já tinham uma pegada de sustentabilidade, já que ela se conecta diretamente à melhoria da produtividade. “Tive a chance de entender os desafios de cada mercado e tendências mundiais para, num processo de inteligência, tomar decisões que impactam negócios por até dez anos. Foi quando percebi que a sustentabilidade era uma necessidade crescente para consumidores, processadores, varejistas e estava se tornando uma questão de sobrevivência para os produtores também”, explica.
A viabilidade econômica é um dos pilares da sustentabilidade, ao lado do social e do ambiental. “Essa jornada me despertou a vontade de implementar programas, produtos e soluções que pudessem melhorar a sustentabilidade do setor produtivo. Sustentabilidade é produzir mais com menos, mais riqueza com menos uso de recursos naturais e desperdício. Tem a ver com gestão, técnica, marketing e possibilita desenvolver estratégias numa relação ganha-ganha para o consumidor, o produtor e o planeta”, resume.
Nesse desejo de unir marketing e sustentabilidade, Saviani deu uma nova guinada na carreira e, em 2014, foi para a WWF (World Wild Fund for Nature) nos EUA, organização voltada à preservação ambiental presente em 120 países. Foi o primeiro brasileiro a ocupar o cargo de vice-presidente de Mercados e Alimentos da organização, na qual guiou por cinco anos o desenvolvimento de estratégias de sustentabilidade em grandes empresas e implementou programas colaborativos para a definição, mensuração e aplicação de melhoria contínua em sustentabilidade, com apoio a produtores e demais elos da cadeia de proteínas animais.
Zootecnia e Sustentabilidade
A maior parte dos impactos ambientais na produção de alimentos ocorre na fazenda, justo onde a maior parte dos recursos são utilizados e o trabalho é menos profissionalizado. Isso torna fundamental o papel do zootecnista, profissional capaz de adotar boas práticas de manejo, tecnologia, treinamento de funcionários e gestão que incrementem melhorias no uso dos recursos. A genética gera eficiência na transformação dos produtos naturais, buscando rações e pastagens produzidas de forma mais eficiente e respeitosa ao meio ambiente. Na nutrição animal, o zootecnista é capaz de formular uma dieta eficaz com o menor uso possível de recursos. E o bem-estar animal, inicialmente visto como algo visando atender ao mercado, passou a fazer sentido economicamente, pois o animal sem estresse produz mais.
“A população está crescendo, seremos 40% mais nos próximos 50 anos, com menos recursos naturais disponíveis. Apenas com altíssimos ganhos de produtividade e eficiência será possível alimentar todo o mundo. Hoje, a produção de alimentos usa 70% da água potável do planeta, emite 20% dos gases de efeito estufa e ocupa 40% das terras. Geramos um impacto enorme e o desafio do zootecnista é produzir mais com menos, sem destruirmos o planeta”, diz.
Cases de sucesso
Na WWF, Saviani integrou uma série de iniciativas que visam tornar mais sustentável a produção animal. Atuou para conciliar as partes envolvidas, estabelecendo iniciativas, princípios e objetivos a serem alcançados. Um exemplo é a produção de carne e soja livres de desmatamento.
Em 2015, com lideranças de outras três organizações, idealizou, planejou e lançou a Iniciativa Florestas e Agricultura (CFA), um esforço de cinco anos que está trabalhando para ajudar a tornar a produção de carne bovina e soja sem desmatamento um padrão global. O resultado são compromissos sólidos de conversão zero de empresas líderes relevantes que compram, distribuem e processam soja e carne bovina nas regiões da Amazônia e Cerrado, no Brasil, e no Gran Chaco, na Argentina e Paraguai.
Outro projeto em que esteve envolvido no Brasil é o Grupo de Trabalho da Pecuária Sustentável (GTPS), uma mesa-redonda implementada há dez anos no Brasil, braço nacional da Global Roundtable for Sustainable Beef (GRSB). Pela WWF, Saviani apoiou a iniciativa e o desenvolvimento, considerando as particularidades locais de produção, de indicadores comuns para definir o que é carne sustentável: que não destrói o meio ambiente, respeita empregados e segue regras de bem-estar animal, por exemplo, com melhor produtividade e de forma economicamente equilibrada. “O desafio agora é fazer as lideranças do setor abraçarem o projeto e levarem a sua implementação em larga escala. Os produtores precisam ser mais eficientes no uso de terras já abertas, dos recursos naturais e pastagens disponíveis. Aqui entra o zootecnista, usando seu conhecimento técnico, gerencial e estratégico para aumentar a produção de forma mais proveitosa e sustentável”, diz.
Para Saviani, que agora atua como consultor independente, essas são oportunidades para o zootecnista mostrar seu valor: “A sustentabilidade é uma oportunidade de gerar negócios, ampliar a rede de clientes e o impacto do seu trabalho. Ajuda a proteger o meio ambiente, os animais e os funcionários, assim como a lucratividade do negócio em uma relação ganha-ganha para todos. É um papel mais nobre, mais amplo. Sou a prova de que é possível ir além”, conclui o zootecnista.
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