Ensino
19/05/2010 – Atualizado em 31/10/2022 – 9:26am
O ensino superior privado do Estado de São Paulo registrou em 2008 a maior taxa de evasão dos últimos oito anos. O recorde é de 24,21% para a Região Metropolitana e de 21,10% em todo o Estado. Em 2000, 60.843 alunos da Grande São Paulo desistiram da faculdade. Em 2008, o número saltou para 168.452. O crescimento é de cerca de 178,5%.
Os dados, obtidos com exclusividade pelo Estado, fazem parte de um levantamento do Sindicato das Entidades Mantenedoras de Estabelecimentos de Ensino Superior no Estado de São Paulo (SEMESP). São considerados dentro do conceito de evasão alunos que abandonaram, trancaram, desligaram-se ou se transferiram para outra instituição. A pesquisa é realizada com base no censo da educação superior do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais (INEP).
As explicações para o aumento da evasão não estão ligadas diretamente à crise econômica, que começou no fim de 2008. Segundo o SEMESP, são três as razões: a inclusão das classes C e D, que desistem por motivos financeiros ou de defasagem acadêmica; a grande concorrência entre as instituições, que "roubam" alunos umas das outras; e a falta de sintonia entre a metodologia dos cursos e os interesses de uma geração que está cada vez mais conectada e envolvida com tecnologia.
"A inclusão das classes C e D é algo bastante positivo. Reduzir valores e criar facilidades de pagamento dá mais acesso aos alunos, mas não garantem a permanência", afirma Rodrigo Capelato, diretor executivo do SEMESP. Para ele, políticas públicas de financiamento, como o PROUNI e o FIES, deveriam ser ampliadas.
Base. Para os consultores em educação que atuam no setor, não se pode atribuir a evasão somente aos alunos. Segundo eles, as faculdades devem reforçar projetos de nivelamento intelectual, ajudando na permanência desses estudantes.
"O sonhos das escolas é incluir as classes mais baixas, que são mais frágeis culturalmente. Então, o mínimo que as instituições devem fazer é dar as mínimas condições para esses alunos se recuperarem", afirma Carlos Monteiro, consultor em educação. "A desistência é culpa das faculdades, que sonham com um perfil de aluno da USP."
A Anhanguera Educacional, que tem hoje mais de 140 mil alunos, investe em um projeto institucional para amenizar as diferenças de conteúdo desses alunos. Comparando o primeiro trimestre de 2010 a 2009, houve melhora na retenção. No ano passado, a taxa de renovação de matrículas foi de 88%. Neste ano, superou os 91%. "A instituição deve criar condições para receber esses estudantes, reforçando a formação humanística que envolva atividades culturais, de expressão e de raciocínio lógico", diz a vice-presidente acadêmica Ana Maria Sousa.
Os diversos métodos publicitários para atrair público, segundo os especialistas, dão a falsa impressão de que é possível permanecer no curso sem dificuldades? Entre 2007 e 2008, segundo o SEMESP, o número de matrículas subiu 4,66%. "Para ter cada vez mais estudantes, as faculdades buscam alunos que não têm o perfil financeiro e intelectual delas", afirma o consultor em educação Ryon Braga.
Jovem abandona curso no 1º semestre
Cerca de 50% do salário de Carlos Henrique Araujo da Silva, de 19 anos, ia para a faculdade de Letras. Morador do ABC, região metropolitana de São Paulo, ele estudava no período matutino da UNIESP de Santo André, antiga IESA, já que a tarde e a noite eram, – e ainda são – dedicadas ao trabalho de cabeleireiro em um salão perto de sua casa.
Mesmo ganhando uma bolsa da instituição e pagando uma mensalidade de cerca de R$ 200, ele só permaneceu na faculdade por um semestre – entrou em janeiro de 2009 e desistiu em junho do mesmo ano.
"Foi mais por causa de dinheiro, mesmo. Eram muitos gastos de uma vez só", afirma. Os livros e as cópias dos textos para leitura e exercícios chegaram à soma de quase R$ 2 mil. "Sem contar que ainda tinha de gastar com o transporte até lá e também com comida."
Foi em março do ano passado, com três meses de curso, que ele percebeu que não ia conseguir conciliar a faculdade com o trabalho e dar conta das despesas. Ele recebeu apoio da família e dos amigos para continuar, mas não teve jeito.
"Além de tudo, eu ainda ajudo a família. Tem o aluguel, contas de água, luz, telefone e as despesas da casa? como fazer supermercado, por exemplo," conta.
Como não tinha créditos suficientes para trancar a matrícula, teve de desistir do curso. "Queria ter trancado, porque queria voltar para o curso depois. Mas não teve jeito", conta. "Eu ia todos os dias para a faculdade, as aulas estavam bem legais. Realmente achava que o curso tinha a ver comigo", continua ele, que quer trabalhar como tradutor de textos e livros do inglês para o português.
Mesmo com as dificuldades de tempo e dinheiro, Carlos quer tentar de novo. Ele pretende voltar, se possível, no início do ano que vem? Para o mesmo curso, na mesma instituição. "Espero que as coisas estejam melhores no fim do ano e que dê para eu continuar."