Abate clandestino

05/04/2010 – Atualizado em 31/10/2022 – 9:27am

Detentor do maior rebanho bovino do país, com mais de 27 milhões de cabeças, Mato Grosso ainda não conseguiu superar um velho problema: o abate clandestino de animais para o consumo doméstico. De acordo com os estudos, 70% da carne in natura bovina consumida na Grande Cuiabá não passam por qualquer tipo de inspeção. São mais de 500 mil animais abatidos de forma irregular, com perdas para a economia e riscos à saúde pública.

“Conseguimos, por meio do esforço da cadeia produtiva e do poder público, oficializar Mato Grosso como exportador de carne à União Européia. Não podemos permitir que questões como estas venham prejudicar essa conquista junto ao mercado internacional”, adverte Paulo Resende da Associação dos Proprietários Rurais do Estado (APR/MT).

O assunto é tão grave que obrigou o Estado a lançar uma força tarefa para fiscalizar e inibir o abate clandestino de animais e o comércio irregular de carnes. Durante mais de cinco meses, fiscais do Indea (Instituto de Defesa Agropecuária) e Vigilância Sanitária dos municípios percorreram abatedouros, supermercados, açougues e outros estabelecimentos comerciais.

O resultado da ação foi a interdição e lacre de três matadouros clandestinos – dois em Várzea Grande e um em Cuiabá – que estavam atuando de forma irregular e sem qualquer licença prévia de funcionamento dos órgãos sanitários. Os processos referentes às interdições foram encaminhados ao Ministério Público Estadual, para outras providências.

No total, foram visitados 74 estabelecimentos industriais (abates de bovinos e suínos, principalmente) e comerciais nos dois municípios, que resultaram em 50 autuações. O valor das multas atinge a cifra de R$ 600 mil.

De acordo com o presidente do Indea, Décio Coutinho, o Estado continuará combatendo de forma enérgica os abates clandestinos e, para isso, um levantamento das plantas já está sendo feito pelo Indea junto aos órgãos que representam o setor. A força-tarefa é constituída ainda por pecuaristas e tem por objetivo inibir a comercialização ilegal de carne.

“O Estado não se omitirá, pelo contrário, continuará agindo de forma firme e eficaz no combate a esse tipo de ilegalidade. O governo estadual tem combatido com veemência esta questão do abate clandestino, porém, é preciso que os produtores nos ajudem e mostrem onde existem os abatedouros para que o Estado possa fazer sua parte”, salienta.

ATUAÇÃO – Nessa ação, os técnicos do Indea/MT são responsáveis pela fiscalização do transporte intermunicipal do gado. “Este é um projeto piloto que foi executado primeiramente em Cuiabá e Várzea Grande. Temos estrutura para realizar a fiscalização de forma estratégica. Nesta primeira etapa a atuação ficou concentrada na Grande Cuiabá, entretanto, pretendemos levar a força-tarefa para as cidades-pólos na identificação e combate a esse tipo de crime”, disse.

O presidente do Indea explicou que o número levantado sobre a estimativa de abates clandestinos no Estado foi feito através de um cruzamento de dados junto com a Associação dos Criadores do Estado (Acrimat).

A ação conjunta identificou problemas também no interior do Estado, onde a estrutura dos abatedouros é mais precária e expõe à população a riscos de doenças. “Estamos solicitando ao comércio varejista que nos apontem os responsáveis pelos abatedouros clandestinos. O comércio e a população precisam nos ajudar a chegar aos infratores”, clama Coutinho.

Abate precário de animais nos matadouros clandestinos impõe riscos à saúde em MT

Além da falta de higiene durante todas as fases do processo, o abate precário de animais nos matadouros clandestinos impõe riscos à saúde humana.

De acordo com os especialistas, entre os problemas conseqüentes da prática ilegal, o principal deles são os riscos de contaminação à saúde pública.

Nos abates clandestinos o animal é morto a marretadas ou a tiros, seu sangue escorre pela terra e depois caem em rios ou córregos, locais onde geralmente são realizados os abates, para facilitar a captação de água.

Sangue e restos de animais acabam sendo despejados nas águas, envolvendo ainda a questão ambiental. Pedaços de carne costumam cair sobre a terra, onde moscas pousam sobre fezes de outros animais.

Mas as conseqüências do abate clandestino não se resumem a isso. As diferenças entre a forma irregular e a forma correta de se abater um animal podem não ser percebidas no bife que se compra no açougue. Na maioria das vezes, elas só se manifestarão com os efeitos indesejados após o churrasco.

Nos abates clandestinos não há um profissional habilitado para saber se o animal a ser abatido é saudável. A inspeção do veterinário é fundamental para detectar se o animal abatido sofria de alguma doença ou tinha algum processo de infecção.

As mais comuns e que podem ser transmitidas ao homem são cisticercose, tuberculose, toxoplasmose e brucelose. A falta de higiene nos locais do abate e na manipulação da carne também contribui para a contaminação humana.

O risco de transmissão de zoonoses é bastante sério, o que tem obrigado as autoridades a se preocupar com as condições dos matadouros municipais para coibir o abate clandestino.

Além dos problemas à saúde pública, o abate clandestino pode afetar também o meio-ambiente, na medida em que pode acarretar poluição ambiental com o depósito irregular da mercadoria ou com dispensa de dejetos em mananciais.