JUSTIÇA

01/11/2009 – Atualizado em 31/10/2022 – 9:28am

A legislação ambiental vigente prevê de seis meses a um ano de prisão para quem transporta espécimes da fauna silvestre sem permissão, mas a mesma regra diz, em seu artigo 7º, que o criminoso só ficará detido se for condenado a mais de quatro anos de encarceramento, o que não acontece ainda que a maior pena seja aplicada.

“A lei é feita para quem tem o cativeiro doméstico”, explica Raquel Sabaini, chefe da Divisão de Fiscalização de Fauna, subordinada à Coordenadoria de Operação de Fiscalização do Ibama.

Ao optar por não punir com severidade o comprador de animais em situação ilegal, a legislação pega leve com quem retira os bichos da natureza e os submete a torturas que acabam levando a maioria à morte.

“É o mesmo que falar que o usuário de droga merece a mesma punição que o traficante”, compara Sabaini, lembrando que a lei começou a distinguir traficante e comprador a partir de 2008, quando o Decreto nº 6.514 estipulou que “as multas serão aplicadas em dobro se a infração for praticada com finalidade de obter vantagem pecuniária”, ou seja, ganhar dinheiro.

O não pagamento dessas multas, contudo, não incorre em prisão, como acontecia até a publicação da Lei nº 9.268, de 1996, que alterou o artigo 51 do Código Penal.

A falta de uma punição mais rígida — o que leva à reincidência do traficante — desmotiva a atuação dos fiscais. Resta às forças de repressão tentar enquadrar os traficantes em outros crimes, como o de formação de quadrilha.

“Nunca é uma pessoa só”, garante Hugo Schaedler, chefe da Divisão de Gestão e Proteção Ambiental do Ibama-DF.

“Na última grande apreensão, encontramos 619 canários. Como calculamos que os traficantes geralmente pegam dois pássaros por dia, uma única pessoa teria demorado 309 dias para fazer isso. Ou ela trabalhou com alguém para estocar ou para coletar mais rápido”, conclui.

O problema é conseguir configurar a atuação de um traficante como membro de quadrilha, porque eles circulam em número pequeno e alegam agir sozinhos.

Só o que tem mandado os traficantes de animais para a cadeia no Brasil é a falsificação de selo público. As anilhas que identificam e certificam a legalidade das aves no país têm status de selo público e são exigidas desde 1976.

Sua falsificação incorre em pena de dois a seis anos de prisão, além de multa. Chefe da Delegacia Especial do Meio Ambiente (Dema) do DF, o delegado Antônio Anapolino concorda com penas mais rígidas — “o infrator acaba beneficiado” —, mas diz que, se não houver rapidez e eficácia no cumprimento da legislação, de nada vai adiantar qualquer mudança.

O que diz a lei

O artigo 29 da Lei nº 9.605, de 12 de fevereiro de 1998, prevê detenção de seis meses a um ano e multa para quem, entre outras coisas, “vende, expõe à venda, exporta ou adquire, guarda, tem em cativeiro ou depósito, utiliza ou transporta ovos, larvas ou espécimes da fauna silvestre, nativa ou em rota migratória, bem como produtos e objetos dela oriundos, provenientes de criadouros não autorizados ou sem a devida permissão, licença ou autorização da autoridade competente”.

O parágrafo 4º do mesmo artigo prevê que a pena seja dobrada quando o crime é praticado contra espécie rara ou considerada ameaçada de extinção, ainda que somente no local da infração. Se o crime decorre do exercício de caça profissional, o infrator pode pegar até o triplo da pena.

O artigo 7º da lei, contudo, diz que as penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade quando tratar-se de crime culposo ou for aplicada a pena privativa de liberdade inferior a quatro anos, o que acontece mesmo quando a maior pena é aplicada.

Ou seja, não é possível ser preso apenas por traficar animais silvestres. Entre as penas restritivas de direitos com a mesma duração que teriam as restritivas de liberdade, estão a prestação de serviços à comunidade, a interdição temporária de direitos e o recolhimento domiciliar. (RB)

Fonte: Correio Braziliense